domingo, 25 de julho de 2010

BATMAN BEGINS (Christopher Nolan, 2005).

O texto abaixo foi postado em 26 de Junho de 2005. Um dos meus primeiros ensaios sobre filmes e quadrinhos.


Jamais houve um momento tão propício em nossa história (diz-se: pós-moderna) para ser fã de histórias em quadrinhos.
A recém-nomeada nona arte é finalmente redescoberta pelos grandes estúdios (produtoras) de Hollywood; uma nova fonte de idéias contínua e quase ilimitada torna-se o foco de atenções para novas produções.

E o que torna um "gibi" algo tão atraente?
Stan Lee, uma lenda (ainda viva) das HQ's, responsável pela revolução dos super-heróis no final dos anos 50 - a "Era de Prata dos Quadrinhos" e também pela criação de um dos maiores ícones mundialmente populares como o Homem-Aranha, diz que uma das maiores vantagens de se ler uma revista em quadrinhos, é que a mesma pode ser um "extremo exercício de imaginação e fantasia." Até aí, nada que difere de um bom livro, como o Senhor dos Anéis ou as Crônicas de Nárnia.
Mas o criador dos heróis da Editora Marvel Comics complementa:  "É como se fosse um filme. Só seu. Você controla o tempo deste filme - pode rever quantas vezes quiser sua cena favorita e, dependendo do seu herói favorito, a história não irá acabar tão cedo".

Porém, tratando-se de outro ícone popular como o Batman - a história quase acabou.
E foi por muito pouco.

MITO RECONHECIDO:
Em 1989, depois da 1ª e realmente fiel adaptação de quadrinhos (Superman - de Richard Donner, 1978), o Homem Morcego - concebido para ser o 'contra-ataque' do Homem de Aço - criado por Bob Kane & Bill Finger (este último ainda não reconhecido e creditado pela indústria de quadrinhos por criar vários conceitos essenciais para o universo do Batman) na década de 30, ressurgiu na tela de cinema para fazer jus ao seu nome e reputação. Com um visual propositalmente Dark - para dar ênfase ao seu mundo sujo, corrupto e malévolo que é a cidade Gotham City e um aspecto ainda mais sombrio para o seu guardião - o filme tornou-se um marco de sucesso e bilheterias em todo o mundo. A Editora DC Comics, agora sobre a vigilância dos estúdios e produtora de filmes Warner Brothers, tinha em sua própria árvore, idéias e mais idéias para serem colhidas.
Na mesma época, uma das melhores estórias do Batman fora lançada, considerada como uma das melhores e jamais concebidas: "Batman - O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight Returns)" por Frank Miller. Na Graphic Novel, vemos um Batman de cinquenta anos de idade, aposentado, para depois retornar ao seu manto como guardião de Gotham; nesta, uma pequena previsão dos tempos atuais: Os EUA se livra de seus principais protetores (heróis), sendo o Superman o único e 'principal empregado' do governo. Inevitavelmente, Batman e o Homem de Aço confrontam-se.
Como um estandarte, a estória mostrou que os super-heróis poderiam ser vistos sobre uma perspectiva adulta e inteligente.

SUCESSO E DESCONTROLE: 
Cinema: Diversão e Lucro para os dois lados da moeda.
Após o sucesso do 1º Batman - de Tim Burton, com sua visão sombria, exagerada  e extrapolada, repetindo a fórmula na continuação Batman Returns, mais dark do que nunca, introduzindo a melhor Mulher-Gato já criada para o cinema (ignore totalmente seu filme solo, que não possui nada relacionado com seu conceito original nos quadrinhos).
Mais uma vez, o vigilante de Gotham enfrenta a ferro e a fogo um de seus piores inimigos - o Pinguim.

Porém, algo sempre se perde no meio do caminho: Novamente, produtores e "especialistas" de cinema achavam que Batman Returns era algo muito sombrio para o público; Bom para os fãs, somente. E a idéia não atrairia muito público; Ruim para os lucros.
Então, como aconteceu em Superman III e IV, Batman Forever e Batman & Robin mostraram coisas que destruíram a imagem tão dificilmente construída de um dos maiores heróis dos quadrinhos; para quem jamais leu suas estórias em seu universo natural, Batman havia voltado para o patamar pelo o qual havia sido mais reconhecido durante as décadas de 60 e 70. A infame série de comédia, com Adam West e Burt Ward  e seu quase infinito estoque de estórias absurdas, apetrechos mirabolantes e nenhum respeito pelo conceito original dos quadrinhos. Virou comédia.
Para quem se lembra, os filmes (assim como a antiga série) centravam-se mais no aspecto caricato de seus vilões, um Robin muito revoltado e infantil, até as aparições públicas do Homem Morcego em público, apresentando seu "Bat-Cartão de Crédito" e um uniforme que destacava seus mamilos. Mais um passo retrocedente: Batman é considerado um ícone homossexual e os velhos boatos e piadas que o mesmo tinha um relacionamento com o menino-prodígio voltam à tona.

A franquia havia morrido.

UM NOVO RECOMEÇO:
Joel Schumacher, diretor responsável pelos últimos dois filmes que mataram o Cavaleiro das Trevas como o conhecemos, torna-se o nome mais odiado pelos fãs do personagem. Batman havia perdido sua essência, os estúdios da Warner Brothers perceberam seu erro e algo precisava ser feito.
Desenhos animados como Batman - The Animated Series satisfaziam e remediavam os fãs amargurados, com uma caraterização e reinderização que remetia muito à série animada do Super-Homem dos irmãos Fleischer, entretanto trazia o vigilante mascarado à sujeira e corrupção de Gotham City.



A série gerou tanto sucesso entre os fãs que um longa animado foi feito para manter e até subir o status quo do herói: Batman - A Máscara do Fantasma.
Até uma nova série fora criada (Batman do Futuro) para dar uma nova perspectiva sobre o personagem, explicando e definindo muito bem as razões de sua existência.

Oito anos se passaram.

Neste ínterim, a DC Comics via sua principal concorrente, Marvel Comics ganhar cada vez mais reconhecimento em grandes produções cinematográficas de seus personagens (em parceria com grandes estúdios), como os X-Men, Hulk, Demolidor, Elektra, a trilogia Blade, Quarteto Fantástico e tantos outros que ainda estão para ainda serem transpostos para a tela grande e em live-action, o que atraiu mais fãs para suas publicações na sua forma original: Os Comic Books. A 'amistosa batalha' estava sendo vencida até 2003, quando rumores foram confirmados de que, a Franquia Batman fora assumida por um diretor 'sério' - Christopher Nolan (Amnésia e Insônia) ao lado de David Goyer (escritor de quadrinhos e responsável por escrever a trilogia Blade da Marvel) assumiriam as rédeas do novo projeto que recontaria a Estória (e História) do Homem Morcego no cinema.
Para a satisfação dos fãs, o material escrito por Frank Miller em Batman - Ano Um, seria usado como referência para o roteiro do filme; Sua origem, treinamento, uma Gotham City tão podre como seus habitantes, suas poucas alianças e simbologias. Eis seu maior triunfo: Dentre todas as adaptações cinematográficas feitas, vemos a razão (em toda sua amplitude) de Bruce Wayne, quando garoto, assistir o assassinato de seus pais e todo o seu processo de treinamento para se tornar o maior combatente do crime de todos os tempos.
Nada de origens centradas em seus arquiinimigos, deixando o herói em segundo plano; Nada de Jack Nicholson e/ou Jim Carrey para deixarem o herói a sombra, nem conceitos impossíveis sobre sua cidade e seus equipamentos.

O que vemos em BATMAN BEGINS é um recomeço.
A franquia está sendo recontada do início 'real' - de como um ser humano, munido apenas de motivação, um ideal (e muito dinheiro - o único 'superpoder' de Bruce Wayne) combate o crime usando sua simbologia para causar terror aos criminosos. E o melhor: Está tudo explicado para que até mesmo o mesmo o mais desentendido deste universo possa compreender. E gostar.
Atores de 1ª linha foram selecionados para trazerem à vida os personagens que vemos nas estórias - são facilmente identificáveis por seguirem 'a cartilha' à risca - o que torna todo o resto mais aceitável. Ou seja, assim como os motivos de Bruce Wayne para se tornar um vigilante mascarado vestido de morcego, seus apetrechos, ferramentas e o melhor de tudo - seu carro - foram construídos para darem mais plausividade nas ações de Batman. A 'fantasia' torna-se aceitável, considerando a tecnologia atual para que o herói possa fazer tudo o que faz nos quadrinhos. Tanto que, devido à construção do personagem para uma inserção completa na estória, só vemos o herói em sua forma completa no final da 1ª hora do filme. E tudo queríamos ver está lá: Sua voz, habilidade, silêncio, comportamento soturno.

Ameaças reais estão lá também: Drogas. Depressão econômica. Corrupção.
Mas não espere ficção. Gotham City é o lugar mais sujo e corrupto do planeta. E, de acordo com as especificações do diretor: "Uma Nova Iorque extrapolada". Batman é querido e respeitado por seus fãs porque apesar de habitar em um universo de "heróis coloridos", ele não é um deles.
Esta é a sua melhor adaptação cinematográfica feita até hoje.

Hollywood e sua fábrica de sonhos agora fez suas pazes e anda de mãos dadas com os quadrinhos.
Os antigos leitores cresceram, mas a paixão por velhas fantasias continua.

A época é certa para ser fã de quadrinhos e nós também ganhamos com isso.

Um comentário:

André L. Santana. disse...

Hoje leio este texto e vejo o quanto me esforçava para escrever de maneira plausível.

Mas sei que usaria as mesmas idéias apresentadas nele para explicar para a alguém que nunca leu HQ's sobre o quão díspar pode ser uma adaptação cinematográfica da obra original.